As Causas
Há
vários motivos que explicam a baixa representatividade dos gatos de
raça na Gatofilia. Um dos principais é a forte concorrência
gerada pelos exemplares sem raça definida.
O Gato, por
natureza, é um bicho extremamente prolífico, muito mais do
que o cão. Se deixado livre, como os exemplares de rua ou os que têm
acesso a ela e não são castrados, multiplicam-se em larga e
rápida escala. "Enquanto uma fêmea de Gato é
capaz de entrar no cio a cada três ou quatro meses - às
vezes, se não fecundada, até de quinze em quinze dias -,
podendo gerar até quatro ninhadas ao ano; a fêmea de cachorro
tem no máximo dois cios e duas crias anuais", compara o
veterinário paulistano Marcos Malta Migliano, proprietário
da Clínica Faria Lima, em São Paulo.
O desfecho dessa
imensa capacidade reprodutiva é fácil de concluir: um mundaréu
de pessoas, que gosta de gatos e gostaria de tê-los, adota-os
gratuitamente, doa-os gratuitamente e limita, portanto, o mercado dos
exemplares de raça, normalmente vendidos. "Sem dúvida,
essa realidade interfere muito no hobby dos gatos de raça",
fala a presidente do clube Companhia do Gato, Rose Marie Lynch, também
diretora genealógica e verificadora de ninhada da Federação
Brasileira do Gato, filiada à World Cat Federation (WCF). "Enquanto
os bons criadores se esforçam para produzir bons exemplares de raça,
que têm um custo, há uma quantidade gigantesca de gente
doando os gatos que nasceram em seus próprios quintais ou ruas",
completa ela. "É fato que a oferta de gatos gratuitos é
muito grande, e a população, de forma geral, tende a
preferi-los", concorda Anne Marie Gasnier. "Mesmo que o universo
dos gatos sem raça definida acabe servindo de porta de entrada a
uma boa parcela dos que se envolvem no hobby dos exemplares de raça,
há um percentual muito mais significativo de gente que permanece
afastada", avalia José Clóvis.
Outro fator
que tem influência sobre a pouca expressão dos gatos de raça
nasce de uma questão cultural. O iníciodo hobby dos
exemplares de pedigree, tanto nos gatos como nos cães, data da
mesma época, o fim do século 19. Mas, de lá para cá,
o seu desenvolvimento em torno dos cães foi rápido e grande.
E, em torno dos gatos, lento e bem menor.
Explicação: o
cão sempre carregou a fama de ser o melhor amigo do homem. Sempre
esteve presente - e ainda está - em diversas tarefas humanas, como
a caça, o pastoreio, a guarda e também a companhia. Assim,
desde o começo, o cão atraiu multidões para o hobby.
Já o Gato, em muitas sociedades, sofreu - e, até hoje, às
vezes sofre - diversos preconceitos, como o de ser associado às
bruxas, de ser traiçoeiro etc. A única função
do Gato para muita gente era - até cerca de 100 anos atrás -
a de exterminar os ratos.
Ele nem sequer costumava ser aceito dentro
das casas. Vivia, normalmente, nas ruas, jardins e quintais. O Gato como
bicho de estimação e companhia, fazendo parte da vida da
casa, tem bem menos tradição do que o cão.
Com tantas barreiras regendo o seu passado distante e até
recente, dá para entender o porquê de o hobby dos exemplares
de pedigree ser tão incipiente em relação ao dos cães.
Hoje, só como referência, há mais de 400 raças
caninas.
E apenas algumas dezenas de felinas, sendo boa parte delas
desenvolvida somente nos últimos 30 ou 40 anos - fase coincidente
com a diminuição do preconceito em relação ao
Gato. "Com certeza, a criação de cães, desde o
início, teve bem mais adeptos e bem mais apoio do que a dos gatos",
diz Rose Marie. "Atualmente, as associações caninas são
mais fortes e organizadas do que as felinas, as sim como há mais raças
de cães e mais divulgação sobre elas do que no mundo
dos gatos de pedigree", acrescenta.
"Falta tradição
e divulgação do hobby dos gatos de raça e falta
dinheiro para que haja essa divulgação e se crie a tradição,
porque os patrocinadores poten-ciais sabem que não há muita
gente envolvida nisso e, portanto, investem pouco ou nada", analisa
Alva.
No Brasil, em especial, a pouca tradição em relação
aos gatos de pedigree é notável. "Aqui, a primeira
entidade de gatos só surgiu nos anos 70 e, mesmo assim, foi fundada
por uma francesa", conta José Clóvis, referindo-se a
Anne Marie Gasnier. Para efeitos comparativos: o primeiro clube nacional
de cães foi fundado cinco décadas antes.
A consciência
das pequenas proporções do hobby dos gatos de raça, e
a certeza de que ele tem potencial para crescer, estimula as entidades
felinas a oferecer atrativos que conquistem mais participantes (veja
quadro Em Busca de Novos Adeptos).
"É preciso divulgar a
importância de se ter um Gato com pedigree", afirma Anne Marie,
refletindo um pensamento comum a todos os criadores de exemplares de raça.
Há, indiscutivelmente, muitos pontos positivos oferecidos por
esses gatos. O pedigree é sinônimo de garantia racial, de
valorização, de direitos e de benefícios.
GARANTIA RACIAL
Somente o pedigree - também chamado pelas
entidades oficiais de Livro de Origem (LO) - garante a pureza rácica
de um Gato. É um documento oficial de registro, no qual constam os
dados básicos de pelo menos três gerações
anteriores à do titular.
O simples fato de atestar a pureza
racial de um exemplar já o valoriza, assim como aos seus filhotes.
Afinal, via de regra, por detrás do pedigree de um Gato está
a iniciativa - normalmente de várias pessoas - em se manter a
identificação de todos os exemplares nele citados. Isso
garante, no mínimo, que eles estão aptos a fazer parte
daquela raça e, na maioria dos casos, que são - a exemplo do
titular - puros.
E por puros deve-se entender aqueles que, além
de retratarem a aparência da raça à qual pertencem,
também portam e transmitem geneticamente, pelo menos, boa parte de
suas características. "Há muitos casos de exemplares
sem pedigree que são fisicamente idênticos, ou quase idênticos,
aos de uma determinada raça e que, na verdade, são mestiços",
conta José Clóvis. "E por mais parecidos que sejam com
uma raça qualquer, não se pode prever que tipo de característica
transmitirão, ge neticamente, aos futuros filhotes",
acrescenta ele.
Já o pedigree propicia o contrário:
sabendo avaliá-lo, é possível fazer uma boa previsão
de quais características o Gato titular deve transmitir e de qual é
o melhor parceiro para acasalar com ele.
A recente criadora
paulistana de Maine Coon, Marcia Paul, que entrou no hobby dos exemplares
de raça há dois anos e meio, já pôde
experimentar com sucesso o uso do pedigree como aliado na previsão
das características da ninhada.
"Obtive a primeira cria
no ano passado e, pelos pedigrees, pude estimar quais cores teriam os
filhotes", fala ela. "Não deu outra, nasceram exatamente
como eu havia suposto." Outra apaixonada por gatos que se deixou
seduzir pela criação dos exemplares de raça foi
Roselene Modenesi de Queiroz Carreira, do Rio de Janeiro. Criando Persas há
cinco anos, ela se entusiasma com as possibilidades geradas pelo pedigree.
"Agente sabe quem são os pais, os avós, os bisavós
e, assim, dá para fazer uma criação organizada, dá
para planejar os cruzamentos, aprimorando a raça e valorizando os
nossos exemplares", descreve ela.
"O pedigree também é
importante para que se evitem acasalamentos consanguíneos não
programados, que podem causar diversos males genéticos",
indica Rose Marie.
Outro benefício dos gatos de raça é
que, informando-se sobre eles, pode-se escolher qual tem o temperamento
mais adequado ao seu gosto e estilo de vida.
Mesmo que os padrões
raciais felinos, diferentes dos caninos, só costumem descrever as
características físicas e não as de temperamento, é
consenso entre os criadores que cada raça tem o seu estilo peculiar
de ser.
"É importante que as pessoas saibam que as
diferenças raciais de temperamento não ocorrem apenas entre
os cães, as raças de Gato também possuem suas
particularidades, e elas são selecionadas nos acasalamen-tos",
diz Rose Marie. "Há as raças ativas e brincalhonas; há
as mais sossegadas, há as bem sociáveis, as mais reservadas
e assim por diante", exemplifica ela.
fotos.: AnimalCard
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